domingo, 21 de junho de 2009

Saudade


Tem dias que a gente acorda com saudades e não sabe muito bem o motivo. Percebemos, talvez, um gosto de qualquer coisa na boca, o cheiro de algum lugar ou apenas um peso nos olhos ou um aperto no peito. Enfim, uma melancolia que não sabemos bem identificar porque surgiu. Hoje foi um desses dias. Acordei melancólica e os sintomas da saudade estavam por perto. Apesar de muitas coisas para fazer permaneci apática e sem ânimo para iniciar a lida do dia, preferindo sentar para ler meus e-mails antes de qualquer coisa. E foi uma boa escolha, pois deparei-me com a mensagem de uma amiga que, certamente, acordou com saudades também e me presenteou com um belo texto. O fato é que amanheci com muitas saudades de coisas como: uma infância feliz junto aos meus irmãos que hoje moram em outras cidades, da mãe que também está longe, do pai que já se foi... saudades de antigas amizades que ficaram prá trás pelas circunstâncias da vida e saudades dos filhos.... de um tempo em que a casa estava cheia, as crianças (e depois adolescentes) fazendo barulho, dando trabalho, mas pertinho de mim, sob os meus olhos e cuidados. Meio à essa "seção de saudosismo" li a mensagem enviada por minha amiga e me coloquei de pé, pronta para iniciar o dia com o olhar mais amplo sobre esse sentimento, que por vezes é perturbador. O texto me ensinou que quem sente saudades na verdade, foi abençoado, pois "saudades é o amor que fica". Isso basta para que eu não tenha receio de experimentá-la, pelo contrário, desejo sentí-la intensamente e inúmeras vezes ao longo da vida, pois quem muita saudade senti é sinal que muito amou.


Vamos ao texto (obrigada, Fatinha por compartilhá-lo):


DEFINIÇÃO DE SAUDADE


Artigo do Dr. Rogério Brandão, Médico oncologista

Como médico cancerologista, já calejado com longos 29 anos de atuação profissional (....) "... posso afirmar que cresci e modifiquei-me com os dramas vivenciados pelos meus pacientes. Não conhecemos nossa verdadeira dimensão até que, pegos pela adversidade,descobrimos que somos capazes de ir muito mais além. Recordo-me com emoção do Hospital do Câncer de Pernambuco, onde dei meus primeiros passos como profissional. Comecei a freqüentar a enfermaria infantil e apaixonei-me pela oncopediatria. Vivenciei os dramas dos meus pacientes, crianças vítimas inocentes do câncer. Com o nascimento da minha primeira filha, comecei a me acovardar ao ver o sofrimento das crianças. Até o dia em que um anjo passou por mim!
Meu anjo veio na forma de uma criança já com 11 anos, calejada por dois longos anos de tratamentos diversos, manipulações, injeções e todos os desconfortos trazidos pelos programas de quimios e radioterapias. Mas nunca vi o pequeno anjo fraquejar. Vi-a chorar muitas vezes; também vi medo em seus olhinhos; porém, isso é humano!
Um dia, cheguei ao hospital cedinho e encontrei meu anjo sozinho no quarto. Perguntei pela mãe.. A resposta que recebi, ainda hoje, não consigo contar sem vivenciar profunda emoção.
" - Tio, disse-me ela, às vezes minha mãe sai do quarto para chorar escondido nos corredores. Quando eu morrer, acho que ela vai ficar com muita saudade. Mas, eu não tenho medo de morrer, tio. Eu não nasci para esta vida!" Indaguei:
- E o que morte representa para você, minha querida?
" - Olha tio, quando a gente é pequena, às vezes, vamos dormir na cama do nosso pai e, no outro dia, acordamos em nossa própria cama, não é?" (Lembrei das minhas filhas, na época crianças de 6 e 2 anos, com elas, eu procedia exatamente assim.)
- É isso mesmo.
"- Um dia eu vou dormir e o meu Pai vem me buscar. Vou acordar na casa Dele, na minha vida verdadeira!" Fiquei "entupigaitado", não sabia o que dizer. Chocado com a maturidade com que o sofrimento acelerou, a visão e a espiritualidade daquela criança.
"- E minha mãe vai ficar com saudades, emendou ela." Emocionado, contendo uma lágrima e um soluço, perguntei:
- E o que saudade significa para você, minha querida?
- Saudade é o amor que fica!
Hoje, aos 53 anos de idade, desafio qualquer um a dar uma definição melhor, mais direta e simples para a palavra saudade: é o amor que fica! Meu anjinho já se foi, há longos anos. Mas, deixou-me uma grande lição que ajudou a melhorar a minha vida, a tentar ser mais humano e carinhoso com meus doentes, a repensar meus valores. Quando a noite chega, se o céu está limpo e vejo uma estrela, chamo pelo "meu anjo", que brilha e resplandece no céu. Imagino ser ela uma fulgurante estrela em sua nova e eterna casa.
Obrigado anjinho, pela vida bonita que teve, pelas lições que me ensinaste, pela ajuda que me deste.
Que bom que existe saudade! O amor que ficou é eterno.

Rogério Brandão
Médico oncologista clinico

RC Recife Boa Vista D4500

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